quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Pescaria em Moledo

Andei vários meses a fazer planos para ir pescar, mas foram sucessivamente adiados com desculpas meio esfarrapadas que dava a mim próprio. Ora estava “muito mar”, ora estava frio, ora não tinha maré para apanhar isca, vocês sabem muito bem como é.  Também não tinha licença, o que é sempre uma boa desculpa!
Como tive duas semanas de férias em Julho pensei que desta vez é que era e tinha de ir desenferrujar o material. Tirei a licença no multibanco, revi o material e conclui que o melhor era refazer todas as baixadas, pois não me ofereciam o mínimo de segurança. Sempre fui adepto de substituir os materiais ao fim de algum tempo de uso, pois o contacto com a água salgada e as pedras enfraquecem tudo, as linhas, os anzóis, os distorceres, etc..
Então, um fim de tarde ventoso que me tinha corrido da praia para fora, enchi-me de paciência e fiz uma bela sessão de bricolage, como já não fazia há imenso tempo.
Na manhã seguinte fui à isca para Penedim (perto do Sanatório da Gelfa), dei cabo dos dedos e das unhas, mas consegui a “sintética” mais que suficiente para uma noite de pesca.
Não sei se sabem que “sintética” é aquilo que vocês conhecem como “linhas” ou teagem. Andava lá à isca o Mário, um amigo que é padeiro e que também estava de férias.
Conversa daqui, conversa dali enquanto apanhávamos isca, disse-me que ia pescar à noite com o cunhado ali no praial de Âncora, enquanto eu lhe disse que iria para Moledo, mais por causa da maré, que faria o baixa-mar lá perto da meia-noite. Eu gosto de pescar em Moledo, nas últimas horas do baixa-mar. Manias!
Depois do jantar, meti os “tarecos” no carro e abalei para Moledo, estacionei junto ao ultimo passadiço, junto ao Camarido e comecei a montar a cana, uma Hiro Boomerang de quatro metros e meio, com carreto Shimano Ultegra, carregado com multifilamento Fireline 0,22. Os anzóis continuam a ser Aberdeen muito comprido e finos, ideais para a sintética. Pelo menos é essa a minha opinião!
Enquanto montava a tralha, reparo que há movimento dentro do pinhal e reconheço a já habitual raposa que fez do contentor do lixo próximo um ponto de paragem diário. Já é a terceira ou quarta vez que vejo aquele bicho por ali. Não se impressionou com a minha presença, limitou-se a esperar que eu me “pirasse” para avançar a todo o gaz para o contentor.
Quando cheguei à praia estava o sol quase a esconder-se no horizonte, não havia vivalma, o que me admirou e me levou a pensar, “para não estar ninguém ou não tem dado peixe ou está cheio de lixo”.
Lá avancei até ao Bico da Ruiva, aquele pequeno bico mesmo em frente à Ínsua; isquei os anzóis e lancei para uma coroa de areia que já se adivinhava. Pouco depois verifiquei que a água corria para sul, recolhi e encontrei algum lixo nos anzóis. Voltei a lançar e pouco depois voltei a recolher com uma boa carrada de lixo. “Que grande merda, primeiro dia que venho pescar e está tudo cheio de lixo; por isso não está cá ninguém”, pensava eu, já desanimado.
Entretanto escurecera e decidi ir para sul até ao “Moinho” e lá tentar a sorte. Como a água estava faltar devido ao baixa-mar, viam-se claramente os areios e decidi pescar sobre um deles. Lá me mantive durante mais de uma hora sem qualquer resultado. De repente, surpresa… senti um toque, outro toque, puxo um pouco a cana para mim e sinto o peixe preso. Recolho nas calmas, é pequeno, pelo menos parece.
Era mesmo pequeno e vinha embuchado. Para lhe retirar o anzol quase lhe fiz uma autópsia. Pouco depois outro toque, a mesma operação e uma sargueta pequena, também embuchada. A partir daí tirei mais duas sarguetas e outro robalinho, tão pequenos que os devolvi ao mar, até porque não estavam embuchados e podiam sobreviver.
Notei então que um pouco mais a sul havia um rego entre duas coroas de areia, onde o mar não virava. “É ali mesmo que vou mandar dois lances, se der a mesma missanga vou já embora”.
Lancei para o tal rego, pousei a cana no suporte e subi um pouco a praia para ver melhor o trabalhar do mar.
Quando desci pareceu-me que a cana estava a dobrar, mas todos sabemos que muitas vezes é o mar ou apenas ilusão óptica; é que de noite todos os gatos são pardos.
Mas este não era pardo, a embraiagem já cantava e mal pus a mão na cana percebi logo que estava do outro lado um figurão de peso. O peixe até nem deu muito trabalho a vir para terra, apenas tive algum cuidado na rebentação e facilmente ficou em seco.
Mais que depressa, com o coração aos saltos, meti-lhe os dedos na guelra, levantei-o e calculei uns dois quilos de peso.
Toca a iscar outra vez, tudo me fugia das mãos e comecei a pensar que antigamente não me davam estes tremeliques. Se calhar é da idade!
Acabei por lançar, mas desta vez fiquei com a cana na mão na expectativa, que se desfez em menos de um minuto quando levei uma autêntica paulada na cana. De repente sinto a linha a sair aos sacões, com uma força enorme. Deito a mão á embraiagem para a aliviar um pouco mais por precaução e deixo de sentir o peixe. Recolho rapidamente, não vá o gajo ter deitado a correr para terra, habilidade que fazem muitas vezes, mas o peixe tinha-se desprendido.
Há muito tempo que não levava uns “coices” daqueles, certamente dados por um peixe realmente grande. Voltei a laçar para o mesmo sítio, mas durante o resto do tempo que lá permaneci não senti mais nenhum toque.
Vim para casa com um misto de sensações contraditórias; trazia um amargo de boca por ter perdido um peixe realmente espectacular, mas no saco “cantava” um de dois quilos e meio, que era quanto pesava o robalo que tinha apanhado.

Neste momento que estou a escrever penso, a frio, que era bom que isto me acontecesse de todas as vezes que vou pescar. Não era? 

Agosto de 2007